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Cathê: ‘Somos os únicos culpados por estar onde estamos’

Eram seis da manhã, o sono já havia acabado, interrompido pelo barulho da rua em pleno domingo. Me estiquei, calcei minha sandália e levantei silenciosamente para não acordar as crianças. Segui direto ao banheiro, fiz a higienização rotineira e fui para a cozinha preparar o café. Coei no tradicional “coador de pano”, do qual nunca abri mão. Alguns amigos até tentaram me fazer aderir ao filtro de papel, mas o sabor do coador antigo e tradicional para mim não tem igual.

Voltei para o quarto e liguei a TV num documentário do meu interesse, mas minha atenção estava voltada para um tema. O que será da humanidade após o término da pandemia?

Encontrei, recentemente, amigos que tiveram o vírus e ficaram com sequelas distintas (respiratórias, musculares e neurológicas) e outros que estão completamente abalados emocionalmente, naturalmente frequentando psiquiatra e psicoterapeuta.

O mundo realmente mudou após esse grande e turbulento evento que já fez aniversário? Nos próximos livros de História, como será que irão narrar esse acontecimento para as nossas crianças? Até quando usaremos máscaras e não poderemos abraçar o próximo? E as pessoas em vulnerabilidade social, terão acesso à reabilitação de suas sequelas ou não poderão mais trabalhar como antes para manter o sustento da família? Não sabemos essas respostas, mas algo real e lógico é que: todos, de uma forma ou de outra, adoeceram!

Adoeceram porque ficaram muito tempo em casa com seus familiares e descobriram defeitos neles, que antes não tinham tempo de observar.

Adoeceram porque tiveram que trabalhar de pijama em casa e a pressão do ambiente de trabalho parecia ser mais produtiva.

Adoeceram porque se sentiram sufocados, não só pela máscara ou isolamento social, mas também por assistir a tantas mortes dia a dia na TV.

Adoeceram porque tiveram que se recriar para ganhar mais dinheiro ou para sustentar suas famílias, devido ao desemprego.

Adoeceram porque nós brasileiros (e especialmente nordestinos) somos calorosos, e ter de conversar com amigos e familiares por reuniões on-lines não é nosso costume.

Adoeceram por medo de adoecerem. Todos. Eu repito: todos adoeceram!

Mas, virando a moeda e olhando agora o outro lado. Aprendemos algumas coisas bem importantes e que os antigos filósofos tentavam nos falar através de livros e didáticas, mas obtiveram bem pouco êxito e quem os compreendia sempre foram taxados como “malucos” ou “antissociais”. Estou falando da solidão!

Há centenas de anos, estudiosos, filósofos e sociólogos falavam sobre a importância da solidão para cada indivíduo e da relevância do autoconhecimento para o ser humano. Isso era sempre deixado de lado. Nós, com o nosso ego inflado, jamais poderíamos compreender que a solidão poderia ser algo positivo, pois precisávamos, assim como um pavão, mostrar nossos dons e, às vezes, os bens materiais. Tínhamos a necessidade de mostrar que éramos melhores do que os outros, mais capazes, mais educados, mais bonitos, etc.

A covid simplesmente colocou todos dentro de seus lares, trouxe uma determinada ociosidade, que nos fez olhar para nós mesmos. Passamos a assistir mais sobre temas espiritualistas, reparar nossos defeitos e nos refazer enquanto humanos. As mães observaram que poderiam distribuir melhor seu tempo com os filhos, os casais foram observando os seus casamentos e onde poderiam melhorar, ou se valia a pena continuar.

A covid nos trouxe um tempo, um pitstop. Fomos obrigados a olhar a nossa vida como um filme e entender o porque somos o que somos e acreditar de vez que nós somos os únicos culpados por estar onde estamos.

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