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Editorial

João Ricardo herda prefeitura estruturada, mas tem desafio da institucionalização

Reprodução

O novo prefeito de Paramirim, João Ricardo Brasil Matos, tomou posse há pouco menos de duas semanas, assumindo, como ele próprio diz, “a difícil missão de suceder Gilberto Brito”. A “dificuldade”, nesse caso, é apenas retórica. Serve para ilustrar a inevitável pressão por herdar uma prefeitura operante e estruturada, sem graves problemas a corrigir.

De fato, apesar de alguns altos e baixos, justificados em grande medida pelas limitações orçamentárias, o saldo deixado por Gilberto é bastante positivo, com avanços quantitativos e qualitativos em todas as áreas. Isso, porém, não significa que tudo esteja perfeito nem que não haja margem para melhorias. Pelo contrário, desde a campanha eleitoral, o próprio João tem destacado a modernização administrativa como um compromisso de gestão.

Nessa direção, já nos primeiros dias de mandato, sancionou uma nova lei de organização administrativa e editou um decreto concedendo maior autonomia aos secretários municipais na gestão orçamentária. Na prática, o organograma ficou mais claro e o primeiro escalão assumiu mais poderes e responsabilidades. Contudo, não obstante essas medidas representem avanços importantes, a nova gestão tem diante de si outros grandes desafios, entre os quais o de aprofundar a institucionalização e romper com o informalismo ainda presente em diversos setores.

Historicamente, em um cenário demográfico e econômico modesto, era compreensível que as ações e relações institucionais se desenvolvessem de maneira mais informal. Atualmente, porém, o contexto é outro. Os novos tempos exigem da administração pública bases sólidas, processos bem delineados e estruturas funcionais que garantam eficiência e previsibilidade. Assim como uma planta necessita de um solo fértil para florescer, uma boa gestão depende de fluxos organizacionais adequados para prestar serviços com qualidade.

A princípio, medidas simples, como a adoção de uniformes e crachás, podem fortalecer a identidade institucional. Paralelamente, entretanto, não se pode abrir mão de mudanças estruturais mais profundas, incluindo uma maior formalização dos processos de trabalho, com definição precisa das atribuições dos servidores de cada setor, de modo a otimizar tanto o expediente interno quanto o atendimento ao público.

Outro aspecto essencial é o investimento em capacitação, especialmente no que tange às relações interpessoais. No âmbito do atendimento ao público, o desenvolvimento de habilidades relacionais deve ser prioridade, sobretudo em áreas sensíveis, como a saúde. Por exemplo, do recepcionista ao médico, todos precisam compreender e aplicar o conceito de acolhimento preconizado pela Política Nacional de Humanização — não são raros os relatos de dificuldades nesse aspecto, muito em razão da inexperiência de parte dos profissionais.

Desafio mais complexo, mas de enfrentamento igualmente necessário, diz respeito à implantação de mecanismos de avaliação periódica de desempenho dos servidores, incluindo os efetivos, com escuta ativa dos usuários dos serviços. É preciso lembrar que a estabilidade funcional assegurada pela legislação não dispensa nem impede que os estatutários sejam avaliados. Pelo contrário, deve-se monitorar a performance para assegurar a observância das atribuições e identificar pontos a serem melhorados, com respaldo no princípio da eficiência na administração pública.

Entre outras medidas imprescindíveis estão a reformulação do Estatuto do Servidor, a criação de um Código de Ética, a atualização do Código de Posturas e, talvez a mais sensível, a revisão do Plano de Carreira e Remuneração do Magistério, de modo a adequá-lo à realidade financeira e administrativa de um município com 20 mil habitantes. Mas esses são assuntos para outro momento.

Muito do que precisa ser feito dependerá da edição de atos normativos, mas, principalmente, de uma transformação na mentalidade coletiva. É preciso reconhecer a necessidade de um remédio amargo, que inicialmente provocará efeitos colaterais incômodos, mas a longo prazo trará benefícios. Não se pode esquecer que muitos dos avanços obtidos pela gestão Gilberto Brito somente foram possíveis graças a um processo exitoso de reeducação social, que, ao menos em parte, resgatou no imaginário coletivo a primazia do interesse público sobre o privado.

João Ricardo não tem uma missão fácil. Reformas estruturais, por sua natureza, geram desconfortos e insatisfações. Entretanto, com o respaldo de uma vitória eleitoral expressiva, uma das maiores da história recente do município, ele possui a legitimidade necessária para tomar decisões difíceis.

Em momentos como este, quando é preciso escolher entre o conforto da continuidade e o desafio das transformações, o que se espera é um compromisso coletivo – da gestão, do funcionalismo e da população. O caminho será árduo, mas é sem dúvida o único possível para que, nas próximas décadas, Paramirim possa alcançar a ambiciosa meta de ser modelo de administração pública no interior baiano.

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